Um diálogo sobre educação com Yuval Harari.

Max Damas

Assessor da Presidência do SEMERJ e da ABMES

Assessor da Presidência da FOA (Fundação Oswaldo Aranha)

A visão de Yuval Noah Harari, historiador e autor dos livros “Sapiens”, “Homo Deus” e “21 Lições para o Século 21”, sobre a educação se alinha profundamente com os desafios e oportunidades apresentados pela Quarta Revolução industrial, caracterizada pela convergência de tecnologias digitais, físicas e biológicas. Ele argumenta que os métodos tradicionais de ensino, que priorizam a memorização e a repetição, são inadequados para preparar os alunos para esta era de mudanças rápidas e disruptivas. Em contraste, a Quarta Revolução Industrial exige uma abordagem educacional que enfatize habilidades como adaptabilidade, criatividade e pensamento crítico, habilidades essas que são fundamentais para navegar nas complexidades das novas tecnologias e interações sociais.

Em seus livros, ele discute amplamente o potencial de máquinas e algoritmos substituírem humanos em várias tarefas, argumentando que, à medida que a tecnologia avança, particularmente com o desenvolvimento da inteligência artificial e da aprendizagem de máquina, é plausível que muitos empregos atualmente realizados por humanos sejam automatizados.

Harari sugere que, em um futuro não tão distante, algoritmos poderiam não apenas substituir trabalhadores em tarefas manuais e rotineiras, mas também em funções mais complexas que requerem tomada de decisão e, até certo ponto, capacidades cognitivas e emocionais. Ele destaca que isso poderia levar a uma “classe inútil” de pessoas, que não apenas estão desempregadas, mas também são “inempregáveis” no novo contexto econômico dominado pela inteligência artificial.

No entanto, Harari também reflete sobre as limitações dessa substituição. Ele questiona se as máquinas realmente podem replicar todos os aspectos da inteligência humana, incluindo a criatividade, a empatia e a capacidade de fazer escolhas morais complexas. Embora a tecnologia possa simular ou até superar humanos em várias funções específicas, Harari pondera sobre a capacidade única humana de atribuir sentido e valor à vida, algo que as máquinas, por enquanto, não conseguem fazer.

Portanto, enquanto Harari reconhece a possibilidade de muitas funções humanas serem substituídas por máquinas, ele também sugere que há aspectos intrinsecamente humanos que as máquinas não poderão replicar facilmente, se é que algum dia poderão. Ele instiga a reflexão sobre o papel dos humanos em um futuro potencialmente dominado pela tecnologia e como a sociedade poderia reestruturar-se para integrar essa nova realidade.

Estudar esses conceitos pode ser extremamente útil para educadores que buscam compreender e responder aos desafios impostos pelo rápido avanço tecnológico e pelas mudanças culturais e sociais profundas que caracterizam o século XXI. Em suas obras são oferecidas uma visão ampla e provocativa sobre a história da humanidade, as potenciais trajetórias futuras da sociedade e o impacto da tecnologia em nossas vidas. Essas reflexões são particularmente valiosas para o ambiente educacional por várias razões:

1. Preparação para o Futuro:

Harari discute a importância de preparar os alunos para um futuro incerto, onde habilidades como adaptabilidade, pensamento crítico e resiliência emocional serão mais valorizadas do que a simples capacidade de memorização ou o domínio de habilidades técnicas que podem se tornar obsoletas. Para educadores, entender essa dinâmica é fundamental para desenvolver práticas pedagógicas que não apenas informem, mas também preparem os estudantes para navegar em um mundo em constante transformação.

2. Foco na Aprendizagem Contínua

A ideia de aprendizagem ao longo da vida é central nas discussões de Harari sobre educação. Em um mundo onde a mudança é a única constante, a capacidade de continuar aprendendo e se adaptando é crucial. Educadores podem utilizar essas ideias para fomentar uma mentalidade de crescimento nos alunos, incentivando-os a ver a educação como um processo contínuo e dinâmico, e não como algo que se conclui ao fim de um ciclo escolar.

3. Reflexão Sobre o Impacto da Tecnologia

Harari provoca reflexões profundas sobre como as tecnologias emergentes estão remodelando a sociedade. Para os educadores, isso pode ser um incentivo para integrar tecnologia de forma crítica e consciente em sala de aula, preparando os alunos para usar essas ferramentas de maneira ética e eficaz, ao mesmo tempo em que os sensibiliza sobre os possíveis impactos sociais e pessoais da tecnologia.

4. Ensino Interdisciplinar

As obras de Harari são intrinsecamente interdisciplinares, entrelaçando história, ciência, tecnologia, filosofia e ética. Essa abordagem pode inspirar educadores a desenvolver currículos que transcendam as fronteiras tradicionais entre disciplinas, promovendo um aprendizado mais holístico e integrado que é vital para entender e resolver os problemas complexos do nosso tempo.

5. Perspectiva Global e Ética

Harari frequentemente enfatiza a necessidade de uma perspectiva global e uma consideração ética nas discussões sobre o futuro. Para educadores, isso ressalta a importância de ensinar os alunos a pensarem além de suas comunidades imediatas e considerar as implicações globais de suas ações, uma habilidade essencial em um mundo cada vez mais interconectado.

Nesse sentido, fica clara a evolução necessária no papel dos educadores ao contemplar o futuro da educação em um mundo transformado pela tecnologia. Com base no que foi colocado até aqui, podemos imaginar um “professor do futuro” e algumas características essenciais que esses educadores deverão possuir:

  • Facilitadores de Aprendizagem: O professor do futuro será menos um transmissor de conhecimento e mais um facilitador de aprendizagem. Isso significa ajudar os alunos a aprenderem a aprender, cultivando a curiosidade e a motivação própria, em vez de simplesmente entregar conteúdo pré-determinado.
  • Adaptabilidade e Aprendizado Contínuo: Professores terão que se adaptar constantemente a novas tecnologias e métodos pedagógicos. A aprendizagem contínua se tornará uma parte integrante da carreira docente, exigindo que eles permaneçam atualizados com as últimas ferramentas e teorias educacionais.
  • Promotores de Pensamento Crítico e Criatividade: Ao enfatizarmos a importância de desenvolver habilidades de pensamento crítico e criatividade nos alunos, os professores precisarão criar ambientes que incentivem a inovação, a experimentação e a solução de problemas complexos.
  • Mentores Emocionais e Sociais: A inteligência emocional será crucial. Os professores precisarão apoiar o desenvolvimento emocional e social dos alunos, ajudando-os a navegar por um mundo cada vez mais complexo e automatizado. Isso inclui ensinar ética, colaboração e comunicação eficaz.
  • Integração de Tecnologia e Humanidades: No contexto da quarta revolução industrial, os educadores deverão integrar conhecimentos de tecnologia com as humanidades, preparando os alunos para entender e questionar o impacto da tecnologia na sociedade e no indivíduo.
  • Promotores de Interdisciplinaridade: Necessidade de uma abordagem educacional mais holística e interdisciplinar. Professores do futuro precisarão conectar diferentes áreas do conhecimento, mostrando como tópicos científicos, artísticos e sociais se interligam.

A visão de Yuval Noah Harari sobre a educação nos abre à possibilidade de destacarmos o “professor do futuro” como facilitador no processo educativo, adaptado às rápidas mudanças da sociedade moderna. Harari enfatiza a necessidade de ultrapassar o ensino de fatos e técnicas, priorizando habilidades como pensamento crítico e adaptabilidade, essenciais para enfrentar um mundo em constante transformação tecnológica. Neste cenário, os educadores devem incorporar uma abordagem interdisciplinar que combine ciência, tecnologia, artes e humanidades, fomentando uma visão holística e global. Eles são chamados a serem guias em uma era de incertezas, promovendo a aprendizagem contínua e o desenvolvimento de uma ética reflexiva sobre o impacto das tecnologias.

Portanto, revolucionar a educação, seguindo as reflexões de Harari, significa criar um ambiente onde o ensino seja tão dinâmico quanto o mundo ao nosso redor. Implica em preparar os alunos não apenas para passar em testes, mas para serem cidadãos conscientes e adaptáveis, capazes de contribuir com soluções para os complexos problemas globais. O professor do futuro é, assim, um elemento chave nesta revolução, atuando como o elo entre o conhecimento do passado e as possibilidades do futuro, e moldando a educação para ser um reflexo das vastas e variadas necessidades de um mundo em constante evolução.

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