Não aprendemos para a escola, aprendemos para a vida.

 

 

Max Damas
Assessor da Presidência do SEMERJ e da ABMES

Assessor da Presidência da FOA (Fundação Oswaldo Aranha)

A antiga máxima latina “non scholae, sed vitae discimus”, que se traduz como “não aprendemos para a escola, mas para a vida”, ressoa com particular relevância na educação contemporânea. Esta frase encapsula uma visão de educação que vai além dos currículos tradicionais, abordando a necessidade de preparar indivíduos não apenas para desafios acadêmicos, mas para uma vida plena e desafiadora fora dos muros das instituições educacionais. Rui Fava, destacado educador e pensador, trouxe uma nova dimensão a esse conceito ao introduzir o termo “inteligência da vida” em seu livro “Currículo 30-60-10. A Era do Indivíduo Nexialista”, que propõe uma educação que integra habilidades práticas, emocionais e sociais essenciais para o sucesso pessoal e profissional no mundo moderno. Ao enfatizar a “inteligência da vida”, Rui Fava argumenta que a educação deve preparar os alunos não apenas para passar em exames ou obter diplomas, mas para enfrentar e superar os desafios reais que encontrarão em suas vidas pessoais e profissionais. Este conceito serve como um chamado para que os sistemas educacionais integrem mais profundamente o ensino de habilidades práticas e reflexivas que são cruciais para o sucesso e bem-estar em um mundo em constante mudança.

Historicamente, essa máxima sugere que a verdadeira educação transcende os limites físicos das salas de aula. Durante a Renascença, por exemplo, a educação foi vista como um meio de enriquecer o indivíduo, preparando-o não apenas com conhecimento técnico, mas também com uma compreensão mais ampla da cultura e da filosofia, que eram consideradas essenciais para a participação ativa na sociedade. Nesse período, o aprendizado para a vida era uma prática estimada, refletindo uma abordagem holística da educação. Contudo, com o advento da Revolução Industrial e as subsequentes transformações sociais, as instituições educacionais começaram a priorizar currículos mais estritos e técnicos, focados em preparar a força de trabalho para as demandas do mercado. Embora isso tenha trazido vantagens como especialização e avanço tecnológico, perdeu-se em parte a formação mais holística e adaptativa que caracteriza a “inteligência da vida”.

Os pontos favoráveis dessa abordagem (mais formal) são evidentes. A educação formal oferece uma base estruturada de conhecimento, permite o desenvolvimento de habilidades específicas e prepara os indivíduos para desafios profissionais específicos. Além disso, as qualificações obtidas são reconhecidas por empregadores e instituições, facilitando a progressão na carreira.

No entanto, algo foi perdido com essa evolução. A educação informal, aquela que acontece fora dos limites das instituições educacionais, muitas vezes não é valorizada da mesma forma. A aprendizagem informal, que ocorre através da experiência de vida, do voluntariado, da arte, e da interação social, proporciona habilidades como pensamento crítico, antifragilidade e adaptabilidade. Essas habilidades são cruciais para a navegação nas complexidades da vida moderna, mas frequentemente não recebem o mesmo reconhecimento ou investimento que a educação formal.

No contexto atual, essa expressão “non scholae, sed vitae discimus” assume uma relevância renovada, especialmente com o advento da aprendizagem ao longo da vida e da educação contínua. O cenário atual é marcado pela rápida mudança tecnológica e pela necessidade de adaptação contínua. A aprendizagem não se limita mais à juventude ou a ambientes acadêmicos; ela se estende por toda a vida de um indivíduo. Dentro desse contexto, caracterizado pela rápida evolução tecnológica e por uma economia globalizada, a necessidade de uma educação que promova a “inteligência da vida” é mais premente do que nunca. As universidades, como pilares da educação superior, estão em uma posição única para liderarem essa transformação. Elas podem implementar diversas ações para cultivar habilidades que transcendam o conhecimento técnico, preparando verdadeiramente os estudantes para os desafios da vida moderna.

Uma ação fundamental é a integração de programas interdisciplinares que encorajem os alunos a explorarem conexões entre diferentes campos de estudo. Isto não só amplia a base de conhecimento, como também desenvolve a capacidade de pensamento crítico e a habilidade de aplicar o conhecimento em contextos variados. Exemplo disso pode ser visto em programas que combinam ciências humanas com tecnologia, preparando os estudantes para entender as implicações éticas e sociais da inovação.

Além disso, as universidades podem fortalecer programas de aprendizagem baseada em problemas reais, onde os estudantes trabalham em projetos que demandam soluções práticas para questões contemporâneas. Este tipo de aprendizagem não só melhora habilidades técnicas, mas também desenvolve adaptabilidade, capacidade de trabalho em equipe e pensamento inovador.

Outra iniciativa importante é a inclusão de estágios e oportunidades de voluntariado como parte do currículo acadêmico. Estas experiências expõem os estudantes a situações da vida real onde eles podem aplicar suas habilidades em contextos desafiadores e, ao mesmo tempo, desenvolverem uma forte consciência social e responsabilidade cívica.

Ademais, é crucial que as universidades ofereçam suporte para o desenvolvimento emocional e social através de serviços de aconselhamento e atividades que promovam a saúde mental e o bem-estar. A inteligência emocional, uma componente chave da “inteligência da vida”, é fundamental para o sucesso em todas as áreas da vida e deve ser cultivada sistematicamente.

Por fim, as universidades devem encorajar e facilitar a educação contínua, reconhecendo que a aprendizagem ao longo da vida é essencial na era moderna. Isto pode ser realizado através da oferta de cursos online, workshops e seminários que permitem aos ex-alunos e à comunidade em geral atualizar e expandir seus conhecimentos e habilidades continuamente.

Portanto, ao focar no desenvolvimento da “inteligência da vida”, as universidades não só estarão preparando estudantes para os desafios profissionais, mas também cultivando cidadãos capazes de enfrentar com sabedoria e eficácia os desafios da vida moderna. Esta abordagem educacional não apenas alinha as instituições com as necessidades contemporâneas, mas também resgata o verdadeiro propósito da educação: preparar para a vida, e não apenas para a carreira. Esses indivíduos estarão melhores preparados para enfrentarem os desafios de um mundo em rápida mudança.

Olhando para o futuro, é possível antever um cenário promissor, onde a educação transcende os limites tradicionais e forma cidadãos globais aptos a navegarem as complexidades da vida moderna. Este futuro de esperança é construído sobre a crença de que, ao integrar efetivamente a “inteligência da vida” nos currículos, as universidades não estão apenas atendendo às necessidades atuais, mas também estabelecendo as bases para um desenvolvimento sustentável e antifrágil.

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