A publicação do Decreto nº 12.456/2025 e da Portaria MEC nº 378/2025 inaugura uma nova etapa na regulação da educação superior no Brasil. Mais do que atualização normativa, trata-se de um reposicionamento conceitual dos formatos de oferta de cursos de graduação, exigindo das Instituições de Educação Superior (IES) uma revisão profunda de seus projetos pedagógicos, arranjos institucionais e estratégias de inovação.
O novo marco estabelece três formatos oficiais de oferta — presencial, semipresencial e a distância — com limites claros e proporcionais de atividades presenciais, síncronas mediadas e assíncronas, vinculados à área de formação e à natureza dos cursos. Essa organização exige rigor documental, clareza na comunicação com o estudante e alinhamento com os atos autorizativos de cada curso.
Para tornar mais clara a aplicação das novas diretrizes, sintetizamos abaixo os parâmetros definidos por área de conhecimento:
Quadro Síntese: Formatos de Oferta segundo o Novo Marco Regulatório
Área/Cursos | Formato Permitido | Atividades Presenciais (mín.) | Síncronas Mediadas (mín.) | EaD Assíncronas (máx.) | Observações |
Medicina | Presencial | 100% | – | – | Vedada qualquer carga horária remota. |
Direito, Enfermagem, Odontologia, Psicologia | Presencial | 70% | – | 30% | Vedada oferta semipresencial ou a distância. |
Engenharias, Produção, Construção, Saúde (demais áreas), etc. | Semipresencial | 40% | 20% | 40% | Permitido o modelo híbrido, com limites proporcionais e controle de presença. |
Educação, Ciências Naturais, Matemática e Estatística | Semipresencial | 30% | 20% | 50% | Vedada a oferta totalmente EaD. |
Demais áreas | A distância | 10% | 10% | 80% | Permitida ampla flexibilidade, respeitados os parâmetros mínimos. |
A partir dessa organização, as IES devem reestruturar seus Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs), Planos de Desenvolvimento Institucional (PDI) e práticas de gestão acadêmica, garantindo aderência aos novos percentuais, especialmente em relação à presencialidade obrigatória e à mediação síncrona controlada. Além disso, o marco normativo traz outras exigências estruturantes:
- Avaliações obrigatoriamente presenciais, com verificação de identidade e inclusão de elementos discursivos (mínimo de 1/3 da nota);
- Infraestrutura qualificada para sedes e polos EaD, com acesso à internet, laboratórios, bibliotecas físicas ou digitais e identidade institucional clara;
- Registros formais nos atos autorizativos e em toda comunicação oficial, com uso explícito dos termos presencial, semipresencial e a distância.
Essas transformações não implicam apenas conformidade regulatória. Elas demandam uma atuação propositiva das instituições, voltada à coerência entre a legislação vigente, o projeto pedagógico e a experiência acadêmica real ofertada ao estudante.
Direções para o Posicionamento Estratégico das Instituições
Diante desse novo cenário, destacam-se caminhos estratégicos que podem orientar uma atuação institucional robusta e proativa:
- Revisão dos PPCs e PDIs com base nos percentuais definidos por área e modalidade, assegurando clareza nos documentos oficiais e nos ambientes virtuais de aprendizagem.
- Formação docente continuada para atuação em múltiplos formatos, com foco em mediação pedagógica síncrona, curadoria de conteúdos e avaliação de competências.
- Monitoramento de aprendizagem baseado em evidências, utilizando indicadores de frequência, engajamento e desempenho para ajustes curriculares contínuos.
- Reposicionamento institucional e comunicacional, reforçando o alinhamento com a legislação, a responsabilidade social e a inovação educacional.
- Valorização dos polos EaD como espaços de vínculo e aprendizagem, com presença institucional efetiva e suporte acadêmico qualificado.
- Integração regulatória com a inovação pedagógica, adotando trilhas formativas, microcertificações e práticas de extensão curricularizadas compatíveis com os limites normativos.
- Criação de guias institucionais e instrumentos internos para orientar setores acadêmicos e administrativos na aplicação dos novos dispositivos legais.
As instituições que compreenderem o novo marco regulatório não apenas como um conjunto de obrigações legais, mas como uma plataforma estruturante para a transformação acadêmica, poderão reposicionar-se com mais clareza, relevância e sustentabilidade no cenário educacional brasileiro. Ao articular regulação com inovação pedagógica, personalização da aprendizagem e responsabilidade formativa, abre-se espaço para o desenvolvimento de modelos educacionais mais responsivos às dinâmicas sociais, tecnológicas e culturais do nosso tempo. Essa transição exige, contudo, liderança institucional comprometida, investimento em qualificação docente, maturidade na governança acadêmica e visão estratégica de longo prazo. O futuro da educação superior será mais regulado, mas também mais conectado à experiência real do estudante — e as IES que forem capazes de alinhar sua missão institucional às exigências contemporâneas de qualidade, flexibilidade e confiança pública estarão à frente na construção de um novo ciclo de legitimidade, inovação e impacto social duradouro.
About The Author
Veja também
-
Humanizar o Digital: O Desafio das Instituições de Ensino no Século XXI
-
A Essência Híbrida da Educação: Um Novo Paradigma para Além da Regulação
-
A Teoria da Cerca e a Inovação Acadêmica na Educação Superior
-
O currículo escolar (também) é um campo de disputa de poder.
-
ENAMED: Uma Nova Referência para a Formação Médica no Brasil