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– Reforma Tributária e a elitização da educação superior

Celso Niskier

Diretor presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES)
Reitor do Centro Universitário UniCarioca

É imprescindível ajustar a reforma tributária que cria a Contribuição Social sobre Operações sobre Bens e Serviços (CBS), em tramitação no Congresso Nacional. Caso contrário, ela será responsável pela maior elitização da educação superior já presenciada na história do nosso país. Também será a pá de cal nas metas do Plano Nacional de Educação e a incubadora de um apagão de mão de obra sem precedentes.

É bem verdade que o atual sistema tributário é muito ruim e precisa ser revisto com urgência. Complexo e dispendioso, é uma fonte infindável de insegurança jurídica e um dos grandes entraves para o ambiente de negócios no Brasil. Contudo a solução para esses e outros problemas precisa ser feito com atenção a um direito humano fundamental e de um dos pilares do desenvolvimento sustentável para qualquer nação.

A substituição do PIS e da Cofins pela CBS resultará em uma elevação expressiva da carga tributária do setor educacional, saindo dos atuais 3,65% para a alíquota de 12%. Fortemente pressionado pela crise econômica que se instalou no Brasil nos últimos anos e pelos desdobramentos da pandemia de covid-19, o setor não teria alternativa a não ser repassar esse aumento para as mensalidades escolares. Projeções estimam entre 6% e 10,5% de acréscimo.

O maior problema está no fato de que, ao contrário do que o senso geral tende a acreditar, a educação particular no Brasil atende, sobretudo, pessoas pertencentes às classes C, D e E. Levantamento realizado pelo Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular constatou que quase 90% das famílias dos graduandos têm renda média familiar per capita de até três salários mínimos.

Nesse contexto, não há dúvida de que aprovação da CBS, sem os necessários ajustes, seria um marco na ruptura do acesso de uma parcela significativa da população brasileira à educação, em especial no nível superior onde as instituições particulares são responsáveis por 75% das matrículas. Previsões iniciais apontam que mais de 160 mil graduandos abandonariam as salas de aula e veriam cair por terra o sonho de ter um diploma de educação superior. Nunca é demais lembrar que além de desonerar o Estado em R$ 225 bilhões, as instituições particulares de educação superior preenchem uma lacuna enorme na formação profissional de milhões de brasileiros que jamais seriam absorvidos pela restrita rede pública de universidades.

Como se o cenário da evasão e da inviabilização do acesso não fosse grave o suficiente, a atual proposta de Reforma Tributária pode resultar no cancelamento da maior e mais bem sucedida política pública de acesso à educação superior do país: o Programa Universidade para Todos (ProUni).

Viabilizado pela concessão de bolsas de estudo (integrais e parciais) para alunos de baixa renda pelas instituições particulares, que abatem custos relativos a impostos como o PIS e a Cofins em troca, as regras propostas podem fazer com que a compensação seja pouco atrativa ou até mesmo inviável para as faculdades, centros universitários e universidades privadas.

Caso isso ocorra, imediatamente mais de 160,8 mil estudantes seriam excluídos do programa. Em 10 anos, mais 682 mil jovens de famílias de baixa renda deixariam de ser beneficiados. E tudo isso no momento em que a outra política nacional de acesso à educação superior, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), tem reduzido sistematicamente o número de vagas ano após ano.

Portanto, tão urgente quanto rever o marco legal tributário do país é garantir que a normativa que o substituirá não puna as camadas sociais mais baixas da população e desencadeie uma série de desdobramentos que colocarão em risco o desenvolvimento socioeconômico brasileiro.

Havia a expectativa de que a reforma tributária fosse votada em 2020, mas a pandemia de covid-19, e as eleições municipais contribuíram para que esse debate fosse adiado. Agora, caberá às novas mesas diretoras da Câmara dos Deputados e do Senado Federal pautar e conduzir o debate no âmbito do Legislativo nacional.

A hora é de reflexão e de união. É preciso tomar decisões que resultem em benefícios para o Estado e seus cidadãos. Precisamos de uma população preparada para superar as adversidades impostas pelas crises econômica e sanitária e isso não acontecerá sem uma sólida formação educacional.

Na maioria das nações, a educação sequer é taxada. Tudo indica que, no atual momento, esse avanço não será possível por aqui. Contudo, não se pode aceitar o aumento de carga tributária sobre um setor essencial como a educação. O país precisa, sim, da reforma tributária, mas de uma reforma que seja pautada por princípios como a equidade e a justiça social.

Felizmente, as lideranças do Congresso Nacional têm sinalizado para a pertinência do ajuste no texto e a priorização da educação, sem aumento de impostos sobre a mensalidade estudantil. A educação superior precisa ser para todos, sob pena de nunca conseguirmos superar os perversos ciclos da pobreza e da desigualdade que há séculos assombram o nosso país.

Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense.

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